Por Ana Claudino, editora do Pretas e Pretos no Poder
Sempre ouvi falar do Festival Latinidades, mas nunca tive a oportunidade de participar do evento. Geralmente, ele acontecia apenas em Brasília e eu moro no Rio de Janeiro. Mas todo ano acompanhava de longe o que estava rolando no festival.
Ainda não tinha o suporte teórico que mais tarde iria adquirir no mestrado, mas desde do meu nascimento já sabia o que era ser uma mulher negra latino-americana. Mesmo sem conseguir nomear teoricamente tudo o que me atravessava, positivamente ou não, eu já tinha uma noção sobre estar nessa existência sendo um corpo político.
Só fui ter acesso aos debates decoloniais em 2019 com 28 anos, apenas no mestrado. Ali conheci Lélia Gonzalez, Yuderkys Espinosa, Ochy Curiel, Maria Lugones, Audre Lorde e tantas outras que vieram antes de mim e pautaram a urgência do feminismo decolonial pautado na América Latina.
Corta para 2023, em maio deste ano comecei a trabalhar como editora do afluente Pretas e Pretos no Poder da Mídia NINJA. Assim que soube que o Festival Latinidades iria acontecer no Rio de Janeiro e que a Mídia NINJA estava com chamada aberta para cobertura colaborativa, falei com a Isis Maria – também editora do PPP e co-fundadora da NINJA – e fui como voluntária.
O Latinidades 2023 aconteceu no Museu do Amanhã, na zona portuária do Rio de Janeiro. Para quem não é do RJ ou desconhece a história daquela região, o museu está localizado perto do Cais do Valongo, onde as pessoas negras escravizadas chegavam dos navios.É histórico ter anos depois um evento ali de celebração do bem viver das mulheres negras.
O painel “Memória e Bem Viver“ foi o que mais me marcou. Primeiro porque foi a primeira vez que vi a Conceição Evaristo bem de perto, ela é uma das minhas principais referências de escrita e produção de conhecimento de mulheres negras. Segundo porque foi o painel mais diverso do festival com mulheres negras de várias partes da América Latina. Olha só a potência das participantes do painel:
- Epsy Campbell – Ex Vice-Presidente da Costa Rica (2018-2022) e Presidente do Fórum Permanente de Pessoas Afrodecendentes da ONU
- Conceição Evaristo – Escritora e linguista, uma das literatas mais influentes do Brasil
- Tonika Sealy Thompson – Embaixadora de Barbados
- Susana Harp – Senadora do México
A mensagem que ficou para mim depois do painel foi a de que somos mulheres negras descendentes de pessoas negras em diáspora e apesar das divisões geográficas , os enfrentamentos à colonialidade do poder e do racismo estrutural por consequência, são experiências similares para todas nós. Assim como as primeiras experiências ao se perceber negra como foi abordado no segundo painel de “Pedagogias Decoloniais”.
Ter tido a oportunidade de registrar para o @pretosepretasnopoder um pouco do que aconteceu no Latinidades, me encheu de alegria! Voltei para casa cheia de esperança e a certeza de que não ando só. Precisamos cada vez mais pautar a produção de saberes feito por mulheres negras, principalmente daquelas que vieram antes de nós. Mulheres Negras Latino-Americanas um dia irão dominar a América Latina! Avante!