Realizada anualmente pela Comunidade dos Arturos, a festividade é um testemunho vivo da herança cultural e da luta pela liberdade
Nesta edição do quadro Festeja Tradição Mineira, somos transportados para o coração pulsante do Quilombo dos Arturos, em Contagem, na região Metropolitana de Belo Horizonte. Vamos testemunhar uma celebração enraizada na história e na resistência: a “Festa da Abolição”.
Realizada anualmente no segundo sábado e domingo do mês de maio pela Comunidade dos Arturos, uma das mais antigas comunidades quilombolas do Brasil, esta festividade é mais do que uma simples comemoração – é um testemunho vivo da herança cultural e da luta pela liberdade. Ao longo dos anos, a festa evoluiu, incorporando elementos simbólicos e rituais que refletem a riqueza da cultura negra mineira e reafirmam o compromisso dos Arturos com a preservação de suas tradições e a luta por direitos.
Comunidade dos Arturos
Uma das mais antigas comunidades quilombolas do país, símbolo da cultura negra mineira, a Comunidade dos Arturos é patrimônio cultural imaterial de Minas Gerais. Sua história começou há mais de um século, no ano de 1885. É fruto da união de Arthur Camilo Silvério e Carmelinda Silva, descendente de escravizados negros africanos, que viviam e trabalhavam, no início do século XX, na região dos atuais municípios de Contagem/MG e Esmeraldas/MG. Com o passar dos anos, a Comunidade dos Arturos se estruturou em torno da família e da devoção a Nossa Senhora do Rosário e ficou conhecida pelo nome de seu patriarca Arthur Camilo. Surgia assim os Arturos que, por séculos, preservam e atualizam diversas tradições da cultura negra brasileira.
Festa da Abolição
A celebração pela abolição da escravidão ocorre por todo o Brasil em lembrança ao fim do período escravocrata. Na Comunidade dos Arturos, a festa faz a ligação com o tempo de cativeiro e com a libertação dos escravizados. É o momento de rememorar a luta e o sofrimento de seus antepassados, além de possibilitar uma atualização daquele momento, revigorando o sentimento de força que os Arturos levam para a vida cotidiana.
Antigamente, a festa era chamada de “Reinadinho” ou “Festa Pequena”, isso em função de durar menos dias que a chamada “Festa Grande”, em devoção a Nossa Senhora do Rosário. Com o passar do tempo, foram introduzidos elementos à festa, como a encenação da assinatura da Lei Áurea, a caracterização de alguns Arturos como escravos, o boi e a realização da Missa Conga. Os Arturos utilizam o evento para discutir o papel do negro na sociedade e a luta por direitos.
O percurso e os ritos
A Festa de Abolição é um grande evento composto por vários elementos com etapas distintas e, por vezes, simultâneas. Nos dias de celebração, os Arturos, as guardas e ternos de congado de várias cidades de Minas, a população e turistas em geral, percorrem espaços dentro e fora da Comunidade, no vai e vem de cantos e cores.
A festa inicia na sexta-feira apenas para a comunidade com a realização do candombe, um ritual de origem, do qual os Arturos são originários. Para os Arturos, o Candombe é a cerimônia mais solene, importante e profunda de todo o Reinado. Segundo as crenças do Congado, foram seus instrumentos que retiraram Nossa Senhora das águas, dando início ao seu reinado na terra, ou o segundo reinado, – o primeiro reinado de Nossa Senhora é no céu, junto a Deus e seus anjos. O Candombe também é o momento de se lembrar do passado de sofrimento e dor, vivido por seus ancestrais escravizados, que se fazem presentes naquele momento.
No sábado, acontece a concentração das guardas de Congo e Moçambique e, em seguida, um cortejo que seguirá até a Matriz de Nossa Senhora do Rosário, culminando com o levantamento de mastros e hasteamento das bandeiras, marcos nas festividades, que possuem um sentido sagrado e religioso para a comunidade e ocorrerão na Casa da Cultura Nair Mendes Moreira – Museu Histórico de Contagem, comunidade dos Arturos e Matriz de Nossa Senhora do Rosário. No domingo, a celebração inicia às 4h, com a Festa da Matina, e vai até às 21h, com o descimento das bandeiras e encerramento da festa.
A Capela da Comunidade é o ponto central de onde saem e retornam os reis, rainha e as guardas. As ruas do entorno, os Cruzeiros, as igrejas, a Casa Paterna, as casas de reis e rainhas e tantos outros, tornam-se locais de passagem obrigatória. Em cada um desses pontos ocorrem ritos e/ou eventos específicos que variam do Candombe à Matina, passando pelo levantamento de mastros e bandeiras, rezas, pagamento de promessas, Missa Conga, cortejos com o Reinado e as guardas e ternos. Uma miríade de sons, cantos e batidas que compõem a atmosfera. Do fogão e do forno saem os alimentos do corpo e da alma para todos que ali estão.
A grandiosidade e diversidade de um estado que revela a força e potência que nasce do interior do Brasil
Essa cobertura foi realizada a partir do Festeja Tradição Mineira, projeto que busca reconhecer a importância das vivências, dos saberes, das expressões e das tradições culturais das mais diversas regiões do estado. Empenhado em preservar esses bens como verdadeiros patrimônio cultural a partir das novas tecnologias e formatos para promover essa valorização.
Apresentado pelo afluente Minas NINJA, o quadro apresenta diversidade de cada festa, seus grupos, danças, folguedos e ritos que ao se misturarem, integram e revelam nossas raízes identitária e a força ancestral que tem Minas Gerais.
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