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Diário de Bordo #5: caravana encontra um pólo de resistência e reflorestamento em Terra Nova do Norte

por | maio 10, 2023

Foto: Mídia NINJA

Por Lidiane Barros

Estamos percorrendo grandes distâncias, num percurso que inclui vias fluviais, rodovias asfaltadas e estradas de terra. Para cumprir nossa próxima agenda, mais trechos de chão! Alguns quilômetros após a sede da cidade, percorremos 47 km adentro, em uma região de Terra Nova do Norte (a 648 km de Cuiabá) que concentra agrovilas. A gente foi conhecer uma família que se dedica ao sistema agroflorestal.

Segundo o site da prefeitura, a agricultura do município “caracteriza-se por minifúndios, que cultivam lavouras de subsistência”. Mas passada a 9ª agrovila, todo nosso caminho foi ladeado por grandes plantações de milho. E isso nos deixou confusos. Mas então, lá estava uma placa indicando nosso próximo destino. Destino esse que virou um verdadeiro pontinho no mapa, pressionado, porque está rodeado pela lavoura mecanizada. Consequência do arrendamento ou venda de terras.

Chegando lá, uma de nossas anfitriãs, a artesã Gisele Bido nos recepcionou com uma pergunta: “Tava boa a estrada?”. Ela nos contou que nossa ida ao território, havia, digamos assim, dado uma “guinada” a uma mudança. A Prefeitura teria feito um “tapetinho” para a Mídia NINJA passar. Seria para evitar algum tipo de repercussão negativa? Como Gisele há muito tempo pede melhorias, mas elas só vieram pontualmente nesta data, façam suas apostas…

Banquete

Chegando lá, fomos recebidos com um banquete preparado pela dona Guiomar, mãe de Gisele. Boa parte dos pratos foi feita com ingredientes que saíram do quintal deles, como purê de inhame e a salada de coração de bananeira. Ah! E de sobremesa teve sorvete de milho e mousse de cupuaçu.

A mesa está montada em um espaço onde funciona – por enquanto – o ateliê da artesã Gisele Bido. A família já trabalha na ampliação da estrutura para receber clientes. Novas perspectivas para o ArtGi Empreendimentos Sustentáveis vieram de um programa de aceleração de negócios, idealizado pela Secretaria de Estado de Cultura de Mato Grosso. O cenário, em uma primeira camada, traz várias frases motivacionais que Gisele mesmo escreveu para se manter focada em seus objetivos. Já a segunda, que salta aos olhos, é mata fechada. Dona Guiomar realça que mais de 5 mil árvores foram plantadas pelo marido, Antônio Carlos.

Resistência

Em um bate-papo, falamos sobre os perceptíveis efeitos das mudanças climáticas, o impacto das lavouras mecanizadas na região e sobretudo, sobre resistência. Antônio Carlos ressaltou que os níveis de água dos poços e rios baixou expressivamente.

Ao mesmo tempo, eles contam que a pulverização de agrotóxicos por aviões os preocupa muito. Para se ter uma ideia, muitas casas do entorno da floresta que eles mantêm, não tem mais limão. Segundo Gisele, as frutas cítricas são as primeiras a morrer. “Costumam dizer que as lavouras mecanizadas são importantes para matar a fome do mundo, só que na verdade, não é bem assim”. O pai completa: “O mundo continua com fome e o grande produtor, só enriquece. Entregam a matéria-prima para outros países e estes, nos entregam o produto beneficiado”.

Fotos: Jhenifer Catherine e Mídia NINJA

Vida sustentável

Com um modo de vida sustentável, eles têm propriedade para fazer críticas. “As pessoas precisam entender que agrofloresta bem cuidada, bem planejada, é uma fonte de renda inesgotável. Garante renda contínua, estável e sustentável, diferente de outros modelos”, alfineta.

O poder de reação e resistência dessa família é inspirador. Em 2019, eles sofreram os impactos de um incêndio na rede elétrica do vizinho. O fogo avançou sobre a casa deles e eles tiveram que começar de novo. Dor maior é pelas árvores e animais que morreram. Os caramujos que encontrou vazios, Gisele pintou e colocou em uma jardineira. Das árvores queimadas tirou a madeira para produzir peças de artesanato, arrematados pela arte da pirografia. “Encontrar os cascos de tatus queimados me comoveu demais. E assim nasce a coleção Fauna Amazônica”. Os equipamentos que ela utiliza para produzir suas peças foram desenvolvidos pelo pai.

Por fim, a gente circulou por uma trilha que também compõe a experiência de uma visita ao ArtGi. Foi num abrigo coberto por lona que encontramos o jerico do Antônio. O veículo artesanal nasceu da junção de peças. Ele explica que parte da suspensão e rodas são de fusca, o câmbio, de Kombi e o motor, Agrale 93. “A gente usa para limpar a área e fazer aceiros”, por exemplo.

Então, de maneira sustentável vão resistindo mesmo sob pressão de grandes áreas de monocultura. Gisele conta que pequeno hotspot virou atrativo também para a comunidade do entorno. “Tem muita gente que diz que nunca vê macaco. Mas aqui, sempre encontramos. Dizem assim: ‘queremos ir ao sítio de vocês para conhecer um pouco da fauna e flora amazônica’. E na hora eu penso logo: ‘mas vocês moram na Amazônia! O problema é que o que tem demais são pés de soja e de milho. É o que tem para mostrar para crianças”.

Saímos mais uma vez renovados com esse negócio de família inspirador! Próxima parada: Alta Floresta!

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